22/08/08

Jardins do Paraíso V ( Farm )




De acordo com o testemunho de alguns dos principais protagonistas, a história musical de “The innermost limits of pure fun”, o primeiro e único álbum dos californianos Farm, conta-se mais ou menos assim.

No verão de 1969 George Greenough, um jovem cineasta praticante de surf, regressou da Austrália com cerca de uma hora de película que filmara em cima de uma prancha nas águas dos antípodas. Consciente que tinha conseguido uma abordagem nova e revolucionária na forma de filmar o surf, estava determinado a montar as fitas e lançar um filme para o qual já tinha título: “The innermost limits of pure fun”. Necessitava no entanto de uma banda sonora.

Contactou um velho conhecido de Santa Barbara, Denny Aaberg, então empenhado em tocar guitarra em todos os “love ins” que a sua itinerância proporcionava. Denny comprou a ideia, arregimentou de imediato os “compadres” Ernie Knapp e Phil Pritchard, e tratou de convencer os irmãos Dragon (Doug, Dennis e Daryl ) que à data, sem grande sucesso, percorriam os cafés e bares de Los Angeles tocando sob o nome de família: The Dragons.



(The Dragons )


Uma química musical pouco usual terá emergido logo nos primeiros ensaios. Os Dragon eram no essencial adeptos do jazz. Aaberg um entusiasta do blues, do bebop e do rock. “The innermost limits of pure fun” nasceu por isso naturalmente eclético.

Gravado em Santa Barbara, praticamente ao vivo no estúdio (“Coming of the Dawn”, a jam que encerra o disco, foi criada e gravada enquanto as imagens captadas por Greenough nas praias australianas eram projectadas numa parede do estúdio ), o álbum constitui um oportuno e inspirado documento onde coabitam em harmonia o acid-jazz, o blues rural, o guitar picking ou o surf-rock psicadélico.

Daí que “The innermost limits of pure fun” visite territórios que à época eram desbravados por pioneiros como Gary Burton Quartet (“Wind n sea”), Booker T (“Animal”), Mose Allison (“Crumble car” e “The eater”), Malachi (“Snake charmer”), ou Freddie King, autor de um explosivo “San Ho Zay” aqui versionado.

Assinalável também, a curiosidade de “The Cruzer”, um tema de Aaberg ( foto da direita com Dennis Dragon na bateria ), cuja estrutura e arranjos pré-datam em cerca de um ano “Been down so long” que haveria de ser escrito pelos Doors para “L.A. Woman”. Por fim, a já referida live-jam “Coming of the Dawn”, espécie de sumário alargado de tudo o que ficou para trás, encerra na perfeição um registo que, enquadrado nos padrões da época, não pode deixar de se considerar notável.

A razão por que permaneceu obscuro durante tanto tempo, terá certamente a ver com o facto dos Farm nunca se terem afirmado como grupo. Depois da estreia do filme e perante o interesse que a banda sonora despertou, o grupo prensou 1.000 cópias de vinil, uma edição privada que colocou à venda nos balcões das lojas de artigos de surf ou vendeu pelo correio. A raridade da edição original é portanto monumental.

Ao longo do tempo o álbum foi objecto de duas reedições ( Austrália e Estados Unidos ) de legalidade e qualidade áudio questionáveis. Ainda assim permaneceu um artefacto obscuro. Até há poucos meses, quando a editora japonesa EM Records, com a autorização dos músicos e o trabalho de remasterização de Dennis Dragon, publicou a versão definitiva da banda sonora. Um trabalho áudio e gráfico finalmente à altura da música.