09/09/18

Fairport Convention & Friends "A Tree with Roots, The Songs of Bob Dylan"



Cheguei primeiro a Sandy Denny, só depois aos Fairport Convention. Aparentemente,  uma bizarria cronológica mas as fontes de conhecimento eram sobretudo as rádios, e na época, as portuguesas    manifestavam as suas idiossincrasias.

Ao escutar pela primeira vez “John The Gun” e “Late November”, ambos retirados ao álbum “The North Star Grassman and The Ravens”,  concluí que aquele talento e aquela voz não podiam ser deste mundo. Como tal mereciam atenção e investigação condicentes.

Na Lisboa de 1972, a metrópole discográfica girava sobretudo em torno do eixo Rua do Carmo / Rua Nova do Almada, com réplicas muito interessantes para os lados da Avenida de Roma e bairro de Campo de Ourique. Porém, na Rua da Victória, no quarteirão situado entre as ruas da Prata e dos Correeiros, existia uma discreta loja de electrodomésticos … em cuja sub-cave se escondia uma extraordinária discoteca. Um espaço tranquilo e acolhedor que visitava com frequência, sempre que a curiosidade ordenava e a bolsa permitia.


Numa dessas incursões de final de tarde, já com o “trabalho de casa” feito, fui directo ao separador do F, em demanda dos Fairport Convention. E lá estava “The History of Fairport Convention”, embrulhado naquela magnífica capa dupla concebida por Fabio Nicoli  ( a árvore genealógica da banda representada por caracteres antigos, a faixa de seda e o selo colados  na frente e um belíssimo booklet de 12 páginas agrafado ao interior ) que logo me encantou. Havia no entanto uma pequena contrariedade, tratava-se de um duplo álbum; como tal bastante mais caro que o normal.

Optei então por fazer aquilo que os miúdos sem pais ricos faziam em circunstâncias semelhantes. Esperando melhores dias, mudei o disco de bancada, intercalando-o no S, algures entre os Slade e os Sweet. Imaginei que ali não corresse grande perigo de procura, a menos que alguém detectasse a marosca. Tive sorte. Quando voltei no final do mês ainda lá estava, no mesmo sítio ( as fotos aqui mostradas são dessa cópia, que ainda conservo ).

Toda esta conversa a propósito de “A Tree With Roots, Fairport Convention and Friends, and The Songs of Bob Dylan”. É que esta compilação abre com “Si Tu Dois Partir”( no original “If you gotta go, go now”, escrito em 1965 mas só publicado por Dylan em 1991 nos Volumes 1-3 das Bootleg Series ) exactamente uma das performances que mais me impressionou quando a escutei pela primeira vez em 1972.

The story goes that Fairport Convention was playing a gig at the Middle Earth and thought it would be amusing to do Dylan's song in French cajun style, so the band called for volunteers from the audience to help with the translation. Richard Thompson: “About three people turned up, so it was really written by committee, and consequently ended up not very cajun, French or Dylan.” This version was first released as a single Si Tu Dois Partir / Genesis Hall with Dave Swarbrick playing fiddle, Trevor Lucas triangle and Richard accordion. The “percussion” break towards the end of the song is the sound of a pile of chairs falling over.’ ( in Mainly Norfolk ).

Embora dezenas o tenham feito, ninguém canta Dylan como Dylan. Considerando apenas dois critérios: um objectivo ( a história ) outro subjectivo ( o gosto pessoal ),  e retirando os Byrds da equação, os Fairport Convention nas suas diferentes  metamorfoses compreendidas entre os anos de 1967 e 1975, foram os que mais e melhor se aproximaram do espírito do bardo.

Ao longo do tempo, Ashley Hutchings, Richard Thompson, Sandy Denny, Simon Nicol e mesmo Trevor Lucas, admitiram a influência que Dylan e as suas canções tiveram no despoletar das respectivas carreiras.

Ashley por exemplo não poupa nos adjectivos quando recorda a audição em 1968 de um acetato das The Basement Tapes ( só publicadas por Dylan em 1975 ): “The honour of being allowed to hear these recordings. Of course, they were incredibly rough, but this mattered not a jot. In fact, it added to the mystery. You must remember the legend that surrounded the whole Big Pink experience only took root much latter. We had only our imaginations to guide us. I think we would have covered practically all the songs if it was solely up to us.

Dylan ‘himself’ devolveria a cortesia uns anos volvidos: “Ashley Hutchings is the single most important figure in English folk-rock. Before that his group Fairport Convention recorded some of the best versions of my unreleased songs. Listen to his bass playing on ‘Percy’s Song’ to hear how great he is.”

E de facto “Percy’s Song” parece ter sido escrita para os Fairport, em particular para a voz de Sandy Denny. It needs a voice like Sandy’s to get the shades of emotion across, from moodiness to compassion to outright fury. There’s not many singers can do that”. ( Simon Nicol ).

Mas para além de “Percy’s Song” ( aqui  com Rick Grech no órgão, numa performance gravada para o John Peel’s Top Gear de 6 Abril de 1969 ), “A Tree with Roots” acolhe um conjunto de 17 versões, parte captada em palco e, por via disso, de qualidade áudio desigual; todavia portentosas todas. Parte já publicadas, outras inéditas.

E é um prazer escutar de novo Ian Matthews e Judy Dyble em “Jack O’Diamonds” e “Lay down your weary tune”, uma Sandy sublime em “I’ll keep it with mine” ou “It ain’t me Babe”, um Trevor Lucas surpreendente em “George Jackson e “Days of 49”, recordar a competência de músicos como Richard Thompson, Jerry Donahue ou Dave Mattacks.

Ter tantos clássicos reunidos num único registo revela-se um luxo e um privilégio a que não se pode ou deve ficar indiferente.