22/01/14

Jardins do Paraíso ( XXXVI )


What’s all that shit about The Beatles?”. Acaso não conhecesse a peculiar discografia de Kevin Coyne, esta simples frase seria suficiente para de imediato me fazer partir à sua descoberta.
Poeta das mágoas da alma e das sombras da vida, Kevin Coyne começou por liderar os Siren com quem editou “Siren” ( 1969 ) e “Strange locomotion” ( 1971 ), dois discos tão brilhantes quanto menosprezados. “Case History” e “Marzory Razorblade”, os primeiros álbuns a solo, são hoje locais de peregrinação histórica, mas à data da sua publicação em nada contribuíram para retirar o “poeta, pintor e showman” da penumbra.
Blame it on the night”  procurou caminhos mais ortodoxos, mas a natureza anti-star do autor, a sua insistente e incómoda busca da verdade nas profundezas da mente humana não ajudaram. Finalmente reeditado, a meio caminho entre as melodias aristocráticas de Van Morrison ( “Wanting you is not easy” ) e o blues rock “imperfeito” dos Siren ( “Take a train”, “Poor Swine” ), o álbum ostenta um porte distinto que o tempo e a distância só valorizaram.
Acresce um detalhe que é tudo menos uma coincidência: a presença das guitarras desse outro proscrito do blues acústico britânico que é Gordon Smith. E é um deleite escutar o improvável casamento entre a extrema inquietação poética de Coyne e a magia musical que emerge de um conjunto de temas tão “difíceis” quanto  notáveis.
Não admira que Robert Wyatt se tenha rendido ao seu talento.