15/12/11

Jacques Vassal, Randy Newman e eu


Finais de 1979. Numa das minhas primeiras visitas a Paris, tinha previamente planeada uma conversa/entrevista com Jacques Vassal, redactor da revista Rock & Folk e, à data, uma das referências continentais no que dizia respeito à música de inspiração folk americana, britânica e francesa.
 

Encontrada a rua e o número, transposta a enorme e característica porta de madeira que os velhos edifícios parisienses sustentam e consultada a “concierge” – “Monsieur Vassal, 1er étage, s’il vous plait” – subimos ( eu e o João ) as escadas e tocámos a respectiva campainha. 30 segundos volvidos , nada aconteceu. No interior do apartamento eram perfeitamente audíveis o piano e voz inconfundíveis de Randy Newman. Nova insistência, não fora a campainha não ter cumprido devidamente os propósitos para os quais ali tinha sido colocada. A porta permaneceu fechada. Lá dentro, a voz nasalada de Newman continuava a arrastar-se por entre as palavras de “Sail Away” .



Por fim calou-se. Segundos depois a porta abriu-se e Monsieur Vassal, ostentando um sorriso de orelha a orelha, fez as honras da casa enquanto simultaneamente pedia desculpa por não ter aberto a porta atempadamente … Era uma regra sua não o fazer enquanto a canção, qualquer canção em escuta, não terminasse.
A esta regra, que fazia questão de cumprir religiosamente, acrescia o facto de Randy Newman ter agendado para essa mesma noite um concerto no Teatro dos Campos Eliseos e, como tal, “precisava de reescutar a sua discografia para se preparar”.




Recordo-me de termos falado de Randy Newman, do seu humor corrosivo, das suas canções peculiares e do estatuto que a sua música principiava a ganhar na Europa. Julgo que não cheguei a abordar com Monsieur Vassal nenhum dos assuntos que me tinham levado a procurá-lo. A dada altura, pediu imensa desculpa mas por razões profissionais necessitava de voltar a escutar Little Criminals”, outro álbum seminal do californiano. E como tal …

Escusado será dizer que a performance de Randy Newman dessa noite foi, aos meus olhos e ouvidos, absolutamente assombrosa. Entre outras coisas, recordo-me que, quando a última nota do piano de “Old man” se dissipou na acústica do Theatre des Chanps-Elysées, e imediatamente antes da sala ribombar em aplausos, na assistência alguém gritou: “Parfait!”. Terá sido Monsieur Vassal?