Há quem aprecie Townes Van Zandt, Howe Gelb, Steve Earle, Will Oldham ou Jeff Tweedy. Eu, genericamente, também. Mas gosto mais de Richard Buckner. Muito mais.
Desde 1994 que sigo os passos ( não se lhe pode chamar propriamente de carreira, uma vez que esta lhe tem sido sistematicamente negada) deste deserdado da música americana. Fascina-me a poética atitude de desprendimento, o total – diria premeditado - desrespeito pelas regras do meio. Há em Buckner qualquer coisa herdada do velho Neil Young ( “follow me if you want, f… you if you don’t” ), algo que raramente é compreendido, mas que é normalmente comum aos que têm consciência do seu valor e que se estão nas tintas para o politicamente correcto. Escutem por exemplo “Since” datado de 1998 e tirem dali as vossas próprias conclusões.
E depois, um artista que dedica um álbum inteiro ( “The Hill” datado de 2000) ao poeta Edgar Lee Masters ( 1868 – 1950 ) e à sua obra prima “Spoon River Anthology” ( existe por aí uma edição bilingue da Relógio de Água, 2003 ) só pode receber o aplauso e o respeito do Atalho.
Acabado de publicar, “Our Blood” é um daqueles discos que cresce com tempo. À semelhança do que sucede com a maioria dos registos do autor, as canções principiam por soar inofensivas, inexpressivas. Depois, à medida que vão saindo do seu casulo, crescem em detalhes melódicos e sobretudo líricos, até atingirem uma dimensão indispensável e urgente. Paciência, tenacidade e tempo são aqui as palavras chave. Quem delas não dispuser pode passar à frente de imediato.
Escrito, gravado e produzido de acordo com o princípio “less is more”, “Our Blood” é um daqueles álbuns que tendo nascido de processos simples é tudo menos simples. Paradoxo? Nem por isso. E a melhor forma de resolver esta equação é aguardar por um fim de tarde tranquilo, esperar pelo silêncio, fazer “reset” aos acontecimentos do dia e partir ao encontro destas canções únicas.
Atentem nos casos de “Traitor”, “Thief”, “Hindsight” ou “Witness” ( os títulos dizem tudo ); as melodias surgem aparentemente inócuas, até que se percebe que estão lá apenas para servir os textos, cruéis e desapiedados, caracterizando personagens que vivem na sombra do equívoco, juntas mas há muito separadas, hesitantes entre o ficar e o partir, esquecendo-se de esquecer.
Como sempre acontece, o tempo irá encarregar-se de fazer justiça a “Our Blood”, como de resto se verifica em todos os casos similares. A tragédia porém é que, nessa altura, seja ela qual for, será já demasiado tarde para o artista Richard Buckner.