Poderá parecer uma associação abusiva, mas sempre que escuto um disco de Mark Kozelek recordo-me das imagens que as fotos de Dorothea Lange ou Robert Frank transformaram em ícones, na América do século passado.
Nas gerações mais recentes não é fácil encontrar um artista ( Howe Gelb anda lá por perto ) que chegue genuinamente ao âmago das idiossincrasias rurais, suburbanas, prosaicas, dos americanos. Daí que cada abordagem de Kozelek ( seja através de temas originais ou de versões ) nos sugira um mergulho no realismo social captado pela objectiva de Dorothea Lange ou no quotidiano folclórico que Robert Frank perpetuou em “The Americans”.
( Dorothea Lange, San Francisco 1937 )
Dir-se-à: mas Mark Kozelek anda há anos a fazer o mesmo disco. E daí, se quase todos têm uma história para contar? De resto, existem diferenças significativas entre as matrizes Red House Painters e Sun Kill Moon. Tal como existem entre estes e os discos a solo, espaços onde Kozelek vai normalmente direito ao osso das canções, sem tergiversações.
E depois, caramba, Kozelek é o único que consegue fazer-me ouvir uma música dos AC/DC até ao fim, facto que, tendo em conta a apreciação que faço da banda australiana, tem um enorme significado.
Nos seus escassos 30 minutos, “The finally LP”, uma compilação de temas gravados avulso para álbuns tributo ou rádios ( como a Antena 3 ), é mais um capítulo a juntar a “Rock ‘n’ roll singer” ou “What’s next to the moon”.
Simultaneamente minimalista e denso, “The finally LP”, que a espaços recorda “The circle game” de Tom Rush, recupera canções de Will Oldham como “New partner” de “Palace songs”, “Celebrated summer” dos Husker Du de “New day rising”, “Lazy dos Low the “I could live in hope”, AC/DC “If you want blood” ( não me perguntem de que disco ) e o célebre “Send in the clowns” de Stephen Sondheim, um tema que toda a gente importante cantou desde Frank Sinatra a Barbra Streisand, mas de que só me consigo lembrar da versão de Judy Collins no álbum “Judith”.
( Robert Frank, Rodeo, NYC 1955 )
“The finally LP” é como quase sempre em Kozelek, um manancial de texturas silenciosas, amplas melodias, espaços vazios e recantos desalinhados. A melancolia pintada em tons de sépia.