Confesso. Não estava preparado para “Rocking Horse”.
Escutado de forma incompleta uma primeira vez, rapidamente foi retirado da gaveta do leitor. Desiludira pela aparente proximidade da voz de Kelli Ali com algumas outras ( Margo Guryan, Linda Perhacs ) de que não sou particular entusiasta.
Escutado de forma incompleta uma primeira vez, rapidamente foi retirado da gaveta do leitor. Desiludira pela aparente proximidade da voz de Kelli Ali com algumas outras ( Margo Guryan, Linda Perhacs ) de que não sou particular entusiasta.
A coisa teria ficado por ali, não fora o facto das canções continuarem cá dentro, semeadas e a pedirem para crescer. Intrigado, dias depois, voltei ao disco.
Duas, três audições mais à frente, a abordagem modifica-se. O calibre das composições assim o determina. Por seu turno, os arranjos e a produção de Max Richter ajudam e muito a transformar “Rocking Horse” num excelente e incontornável álbum de folk barroco, como a Inglaterra não ouvia há muito tempo ( e estou a pesar as palavras ).
Ao contrário da sensação que fica da primeira audição, a voz de Kelli Ali é bem um caleidoscópio de metamorfoses. Tanto pode aninhar-se na herança de Vashti Bunyan, com quem de resto partilha uma romântica errância ( no caso de Bunyan foram os anos vividos numa itinerante caravana cigana na Inglaterra de 1970, enquanto Ali passou os últimos anos palmilhando o eixo Califórnia/México ), como pode mergulhar na versatilidade de Kate Bush ou deixar-se contagiar pelo bucolismo classicista de Virginia Astley. O ambiente é lírico e tipicamente inglês.
Quanto ao produtor alemão Max Richter ( já responsável pela produção do álbum de regresso de Vashti Bunyan ) será justo dizer que está para “Rocking Horse” como Joe Boyd esteve para “Five leaves left” de Nick Drake ( novamente a pesar as palavras ). Não existe uma nota ou um instrumento dissonantes num notável conjunto de 13 canções.
Em crescendo, o álbum avança por entre temas de inspiração medieval como “The savages”, “Rocking Horse” e “Heavens door” até que perto do topo se detém em “A storm in a teacup”, “The Kiss” ou “Flowers” ( esta última a remeter directamente para “River man” ou “Way to blue” de Nick Drake ).
De uma beleza antiga, majestosa, “Rocking Horse” é um daqueles lugares de onde convém sair devagarinho. Prudentemente e para evitar choques desagradáveis, o Atalho decidiu sair pelos trilhos abertos por “Bill Fay” de Bill Fay, “Five leaves left” de Nick Drake, “From gardens where we feel secure” de Virginia Astley e “The time has come” de Anne Briggs. Pelo trajecto escolhido já podem imaginar do que estou a falar quando me refiro a “Rocking Horse”…