25/02/09

Jardins do Paraíso XII ( R.E.M. )

As canções surgem em catadupa, tocantes, singularmente belas, transformando a escuta de “Murmur” numa deliciosa peregrinação a todas as grandes catedrais do rock americano. Nesta linha, Byrds é a primeira imagem sonora que nos regressa à memória. Michael Stipe jura a pés juntos só ter ouvido Byrds depois de ler os críticos, porém a analogia é demasiado tentadora. A voz rouca, a meio caminho entre Roger McGuinn e Gene Clark, temas curtos e incisivos, Rickenbakers, folk-rock, guitarras acústicas soando a eléctricas e, a maior de todas as semelhanças, o estilo “picking” tão utilizado por Roger McGuinn quando dedilhava a sua doze cordas.” ( Blitz nr. 1, 6 de Novembro de 1984 )



Passados quase 25 anos, exceptuando um ou outro adjectivo mais colorido, não mudaria uma palavra do texto acima. Quanto muito, por saber mais agora do que na altura, acrescentaria que “Murmur”, num registo “college rock”, terá sido um dos álbuns que mais contribuiu para colocar de novo a tradição rock “back on tracks”, cimentar o discurso “indie” e, higienicamente, atirar para a berma da estrada as cintilantes futilidades da época (Duran Duran, Heaven 17, Human League, Frankie Goes to Hollywood, Culture Club, ABC, Adam & The Ants, etc ).

A distância permite hoje perceber melhor a importância que “Murmur” teve em 1983. Se um par de anos antes, a cada cinco adolescentes britânicos que escutavam “Velvet Underground & Nico” quatro formavam uma banda, nos Estados Unidos o primeiro álbum dos R.E.M. terá tido impacto semelhante. Bastará recordar o fenómeno da chamada “renascença rock” que produziu entre muitos outros: Dream Syndicate, Violent Femmes, Rain Parade, Absolute Grey, Miracle Legion, Opal, Thin White Rope ou Fetchin Bones.



Hoje, quando Peter Buck e Michael Stipe combatem as suas próprias caricaturas, a recente reedição de “Murmur” funcionaria como mais um piscar de olho ao mercado ( o CD2 reproduz um concerto ao vivo em Toronto 1983 ), não fora o “pormenor” nada despiciendo da remasterização.

Através dela “Murmur” e o extraordinário conjunto de canções que integra não viu alterada nenhuma das características que a produção de Mitch Easter ( a alma dos Let’s Active cujo brilhantismo urge recuperar ) e Don Dixon valorizou em 1983. Existem todavia pormenores instrumentais que a remasterização destaca e que tornam ainda mais visível o estado de graça que se vivia no estúdio onde o álbum foi gravado.

Uma oportuna conjugação de talentos e inspiração que só podia ter resultado num disco magnifico que convoca à paixão a cada abordagem.