06/10/08

Fotheringay "2"


Durante anos julgou-se que o trabalho de estúdio associado aos Fotheringay se resumia aos “takes” das canções que integraram o álbum homónimo de 1970. Em 2004, quando o disco foi reeditado, principiaram a circular rumores que apontavam para a existência de fitas com temas inéditos e que resultariam de sessões destinadas à gravação de um segundo álbum. No ano seguinte, o produtor Joe Boyd confirmou a existência das ditas sessões no livro autobiográfico “White bicycles, making music in the 1960’s”.

O interesse foi tanto que os três Fotheringay sobreviventes, impulsionados Jerry Donahue, decidiram iniciar uma cruzada tendo em vista a recuperação das fitas e maquetas dispersas. O resultado chamou-se “2” e está finalmente disponível.

Os Fotheringay ( Sandy Denny, Trevor Lucas, Jerry Donahue, Gerry Conway e Pat Donaldson ) nasceram em Março de 1970, pouco tempo depois de Sandy abandonar os Fairport Convention. À data, a cantora tinha todas as condições para se lançar numa carreira a solo de sucesso – Joe Boyd de resto apostava nisso -, mas preferiu refugiar-se na maior segurança que uma banda proporciona; opção que seguramente deverá ter tido em conta a relação emocional que mantinha com Trevor Lucas.

( capa interior de "Fotheringay" )

Quando editado no verão de 1970, o álbum “Fotheringay” foi objecto de atenção e experimentou um relativo sucesso, porém uma série de equívocos promocionais relacionados com datas, locais e bandas de suporte para concertos, aliados ao problema que constituía a aerofobia de Denny, hipotecaram, praticamente aniquilaram, o futuro da banda.

Ainda assim, no outono de 1970 os Fotheringay voltaram ao estúdio. Gravaram um conjunto de maquetas e quando em Janeiro seguinte se preparavam para iniciar as misturas, Sandy Denny anunciou a saída. A aventura terminara ali e as fitas das sessões mergulharam no esquecimento.
Hoje, após um trabalho de recuperação brilhante, escutar as onze canções que integram Fotheringay “2” constitui certamente um prazer enorme quer para os fãs, quer para os interessados neste tipo de factos históricos.

Do ponto de vista musical “2” é um artefacto notável. Tendo em conta que as vocalizações que ouvimos foram gravadas ao vivo com a secção rítmica, com o objectivo nunca concretizado de serem trabalhadas mais à frente, o resultado é extraordinário. Mesmo considerando que poderão ter sido ajustadas com recurso às actuais tecnologias.


No conjunto, “2” propõe 11 temas. 5 dos quais inéditos absolutos no universo de Sandy Denny: os tradicionais “Eppie Moray”, “Wild mountain thyme” e “Bold Jack Donahue” ( um título já gravado em 1966 por Trevor Lucas em “Overlander”, um disco a solo muito referido mas que pouca gente viu e menos ainda escutaram ), “Knights of the road” e a versão “basement tapes” da composição “I don’t believe you” de Dylan.

Depois, as primeiras versões conhecidas de “John the Gun” e “Late November”, que haveriam de ser regravadas para “The North star grassman and the ravens” a estreia a solo de Denny. “John the Gun” aparece aqui sem a guitarra de Richard Thompson e o violino de Barry Dransfield, componentes que a inclusão do saxofone de Sam Donahue não consegue fazer esquecer. A versão de “Late November”, lenta e intimista, é já conhecida do sampler “El Pea” e da compilação “Who knows where the time goes?”. “Two weeks last summer” de Dave Cousins revela aqui uma versão inédita em estúdio, “Restless” integra as bases do tema de Lucas desenvolvido mais tarde em “Rising for the moon”, enquanto “Gypsy Davey” e “Silver threads and golden needles” repetem as versões já publicadas em “A boxful of treasures”.

No todo, “2” não estará porventura à altura de “Fotheringay” mas, mais do que uma nota de rodapé no universo da arte de Sandy Denny, representa uma etapa necessária e muito relevante no percurso que a levaria ao topo em “The north star grassman and the ravens” e “Sandy”.