30/04/15

The Silence "S/t"



Os 30 segundos iniciais de “Lemon iro no cannabis” dizem-nos  tudo o que precisamos saber. O “break” da bateria e as espirais do órgão, serpenteando por entre as cordas da guitarra acústica, constituem um dos melhores intros dos últimos anos. 

Entre o folk, a música de inspiração renascentista, psicadelismo do mais fino recorte e as linguagens de vanguarda, Masoki Batoh já nos presenteou com algumas das mais belas e consistentes prestações que a moderna música nipónica produziu. Os oito álbuns do projecto The Ghost, intermitente mas activo desde 1990, são neste particular algo de incontornável. 

The Silence resgata aos Ghost o multi instrumentista Kazuo Ogino, principal apoio de Batoh para “The Silence, uma opção que se revelou fundamental para recuperar a identidade do som de Batoh, algo de que este se havia afastado nos registos recentes, quer a solo, quer com Helena Hespvall.

Regressando a “Lemon iro no cannabis”; estrategicamente colocada a abrir o álbum, é uma das melodias  mais felizes de Batoh. Tudo no tema é perfeito: a robustez do baixo que tudo suporta, o órgão e o piano que adornam, sax e flauta quanto baste, até a harmónica, um instrumento pouco habitual na música do japonês. 4 m e 45 s de viagem em direcção ao cosmos … E, quando no tema seguinte, “Gotter im exil”, Batoh canta “I am an ancient God of magick and music / How lovely all the magick we do …” já não existe espaço para a dúvida.

“Jewels in Tibet” é outra pérola: o piano esboça os contornos da melodia enquanto as guitarras ( acústica e solo ) vão preenchendo o silêncio que resta. E o Tibet, a grande causa de Batoh, em fundo. “Black is the colour of my true love’s hair”, hesitante entre o épico e o bucólico, é puro Ghost, enquanto “Tango Whiskeyman” recorda o compatriota Damo Suzuki através do tema original dos CAN cuja letra foi reajustada. Não fora a flauta, instrumento que julgo os Grateful Dead nunca usaram, e “Triptycon” quase deixa a sensação de que poderia ter saído do lado B de “Aoxomoxoa”. Por fim, escorada numa viola de gamba e num alaúde  renascentista, “Overture” é uma peça de “pastoral chamber music”, uma daquelas ilhas de serenidade de que só Masoki Batoh tem o segredo.

The Silence” bate às portas do céu. Faltou a guitarra de Michio Kurihara para lhe ser facultada a entrada.