09/11/12

Four Quartets "Atlas Collapsing"


Existem momentos na vida em que tudo à nossa volta se desmorona, nada parece fazer sentido, os raciocínios lógicos são uma miragem, os caminhos estreitam-se e a única saída que se vislumbra é um difuso e perigoso abismo. Depois, basta uma palavra esparsa ou um sorriso avulso de alguém que nem sequer conhecemos, uma frase retirada de um livro ao acaso, a tonalidade de uma paisagem que sempre lá esteve mas que naquele momento surge inédita, uma melodia ao acaso… e tudo volta a ser familiar. Tristes contentes, voltamos ao trilho e seguimos em frente, no habitual fado do “como não pode deixar de ser”.
Há dias, quando o piano catatónico, as vozes off e os sinos eclesiásticos de “No Roads lead to Rome”, o tema de abertura do novo Four Quartets, iniciaram a sua espiral evolutiva em redor dos sentidos, percebi que tudo na vida  deve ter, apenas e só, a sua exacta dimensão. Na alegria e na tristeza, tudo é relativo e a correcta perspectiva das coisas nem é assim tão difícil de atingir. Basta olhar para o lado. E ver.

Para aqueles que seguem o Atalho desde o inicio, o nome de Rob Sharples já não é uma novidade. Sigo-lhe  a trajectória  desde 2006 quando “So the story goes”, o primeiro EP, foi editado. E, aqui e ali, apreciando mais ou menos das canções que vai produzindo, continuo absolutamente convencido que se trata de um dos mais inspirados autores de canções que a Inglaterra produziu neste século.
Detentor de uma sensibilidade invulgar, patente nas letras, mas sobretudo nos arranjos delicados e sofisticados com que embrulha as canções, Sharples, repito, transpira toda aquela secular “englishness” que no passado foi a imagem e constituiu a personalidade de nomes como Nick Drake, Sandy Denny, John Martyn ou Shirley Collins.
 

O novo “Atlas Collapsing” uma vez mais assinado com o “nom de plume” Four Quartets, será porventura o menos imediato dos trabalhos de Sharples. A razão radica porventura na inabitual barragem instrumental que desta vez envolve a maioria das canções. Mas, uma vez ultrapassado esse primeiro impacto, e as cordas, percussões e guitarras eléctricas devidamente arrumadas no seu espaço, desaparece a “sindrome Radiohead”, a sinapse é uma realidade e as melodias surgem belíssimas, elegantes, como nunca deixaram de ser.

Canções a referir? Tarefa difícil e que deverá ser tratada no âmbito do foro individual de cada um. “Alter Egotist” como o seu crescendo melódico, instrumental e vocal, será talvez a favorita do Atalho, mas “Atlas Collapsing” não sendo tão imediato quanto  The Paragon of animals” ( 2011 ) alberga algumas das melhores criações do autor e possui todos os ingredientes para envelhecer  digna e graciosamente. Assim lhe demos o espaço e o tempo que necessita.

Nota: “Atlas Collapsing” foi publicado apenas em suporte digital ( aqui ) e segundo apurei  junto do autor, não existem para já planos para qualquer edição em cd ou vinilo.