07/09/12

Bill Fay "Life is people"


There is a valley where the trees stand tall / and an icy wind blows / trees don’t speak but they speak to each other / of a people long ago /when the soldiers came and took away their villages one by one / and the fury of that moment they felt / but could only silently look upon…

There is a hill near Jerusalem / that wildflowers grow upon / flowers don’t speak but they speak to each other / of a crucifixion / just because he said he was the son of God / and the fury of that moment they felt / but could only silently look upon …

Every city bar brawl, every fistfight / every bullet from a gun / is written upon the palms of the holy one  ( There is a Valley )


É preciso ter vida vivida e a inerente sabedoria para escrever assim. Bill Fay – talvez o segredo mais precioso da música inglesa das últimas décadas -, tem-na, e profusamente.

Autor de dois álbuns tão extraordinários quanto negligenciados  ( “Bill Fay” de 1970 e “Time of the last persecution” de 1971 ) Fay, dotado de uma personalidade peculiar, nunca recebeu o merecido reconhecimento em devido tempo. Ignorado pela crítica e pelo público, desapareceu por entre os labirintos esconsos da vida. Sabe-se agora, que para sobreviver trabalhou em jardinagem, em limpezas, na apanha de fruta, em cadeias de supermercados … Porém nunca deixou de escrever canções, aquelas canções maiores que a vida, as quais foi criteriosamente guardando. À espera.

Foi assim durante mais de 30 anos. No inicio deste século, alguns músicos, críticos e melómanos mais atentos e curiosos, “descobriram” finalmente Bill Fay. Os dois álbuns atrás referidos foram reeditados e,  enquanto tal, algumas maquetas dispersas no tempo saíram dos arquivos do autor ( “Tomorrow and tomorrow” 2004 e “Still some light” 2010 ). Porém nada fazia prever o que estaria para vir.

Era sabido que Fay continuava a escrever e a gravar, todos os dias. Mas honestamente, quarenta anos depois, julgo que poucos estariam preparados para uma obra como “Life is People”.  Trata-se na verdade de um conjunto de canções  superlativas, extraordinárias ( passe a redundância ). No género, algo do melhor que o Atalho escutou em muitos anos.

Só um poeta, um sábio e um músico de excepçional, poderiam escrever qualquer  um dos 12 temas que compõem este cd. De facto, sabendo-se a história do autor, quando se parte para a audição de “Life is people”, espera-se  talento e inspiração, mas também se espera algum desencanto e muita amargura.  Nada de mais errado.

Bill Fay é um humanista. Em lugar da antecipada comiseração, existe a esperança e uma forma muito carinhosa, tolerante, de olhar para o ser humano. Tudo isto, sem nunca abdicar do seu percurso  -  … this world’s got me on my knees / there was a time when I used to stand tall / too many years in the factories / scrubbing floors and walls …” ( This world ) - , nem da sua forma muito própria de ver o mundo  - “ thousands of windows / I’m scared of what I see / people wired up to telephones / plugged into TV screens / thousands of windows / I’m so scared of what I see …” ( City of dreams ).

E à medida que as audições avançam, percebemos que estas canções que falam da alma humana, das árvores, do silêncio, das crianças, da montanha, da cidade, de Deus …, entranham-se  na pele, conquistam o espírito, como um vírus. Mas um vírus bom.

E no final do dia estamos em paz connosco próprios – “ … at the end of the day / ain’t nobody else / gonna walk in your shoes / quite the way you do /so be at peace with yourself / and keep a Spring in your heel / keep climbing that Hill / and be at peace with yourself …” ( Be at peace with yourself ). A razão e a emoção lado a lado, porventura  por uma única e última vez.

“… Trees don’t speak but they speak to each other …”