“There is a valley where the trees stand tall
/ and an icy wind blows / trees don’t speak but they speak to each other / of a
people long ago /when the soldiers came and took away their villages one by one
/ and the fury of that moment they felt / but could only silently look upon…
There is a hill near Jerusalem / that wildflowers grow upon / flowers
don’t speak but they speak to each other / of a crucifixion / just because he
said he was the son of God / and the fury of that moment they felt / but could
only silently look upon …
Every city bar brawl, every fistfight / every bullet from a gun / is
written upon the palms of the holy
one” ( There is a Valley )
É preciso ter vida vivida e a inerente sabedoria para
escrever assim. Bill Fay – talvez o
segredo mais precioso da música inglesa das últimas décadas -, tem-na, e profusamente.
Autor de dois álbuns tão extraordinários quanto
negligenciados ( “Bill Fay” de 1970 e “Time
of the last persecution” de 1971 ) Fay, dotado de uma personalidade
peculiar, nunca recebeu o merecido reconhecimento em devido tempo. Ignorado
pela crítica e pelo público, desapareceu por entre os labirintos esconsos da
vida. Sabe-se agora, que para sobreviver trabalhou em jardinagem, em limpezas, na
apanha de fruta, em cadeias de supermercados … Porém nunca deixou de escrever canções,
aquelas canções maiores que a vida, as quais foi criteriosamente guardando. À
espera.
Foi assim durante mais de 30 anos. No inicio deste século,
alguns músicos, críticos e melómanos mais atentos e curiosos, “descobriram”
finalmente Bill Fay. Os dois álbuns atrás referidos foram reeditados e, enquanto tal, algumas maquetas dispersas no
tempo saíram dos arquivos do autor ( “Tomorrow and tomorrow” 2004 e “Still
some light” 2010 ). Porém nada fazia prever o que estaria para vir.
Era sabido que Fay continuava a escrever e a gravar, todos os
dias. Mas honestamente, quarenta anos depois, julgo que poucos estariam
preparados para uma obra como “Life is People”. Trata-se na verdade de um conjunto de
canções superlativas, extraordinárias (
passe a redundância ). No género, algo do melhor que o Atalho escutou em muitos
anos.
Só um poeta, um sábio e um músico de excepçional, poderiam
escrever qualquer um dos 12 temas
que compõem este cd. De facto, sabendo-se a história do autor, quando se parte
para a audição de “Life is people”, espera-se
talento e inspiração, mas também se espera algum desencanto e muita
amargura. Nada de mais errado.
Bill Fay é um humanista. Em lugar da antecipada comiseração,
existe a esperança e uma forma muito carinhosa, tolerante, de olhar para o ser
humano. Tudo isto, sem nunca abdicar do seu percurso - “ … this world’s got me on my knees / there
was a time when I used to stand tall / too many years in the factories / scrubbing floors and walls …” ( This world ) - , nem da sua forma muito
própria de ver o mundo - “ thousands of windows / I’m scared of what I
see / people wired up to telephones / plugged into TV screens / thousands of
windows / I’m so scared of what I see …” ( City of dreams ).
E à medida que as audições avançam, percebemos que estas
canções que falam da alma humana, das árvores, do silêncio, das crianças, da
montanha, da cidade, de Deus …, entranham-se na pele, conquistam o espírito, como um vírus.
Mas um vírus bom.
E no final do
dia estamos em paz connosco próprios – “ …
at the end of the day / ain’t nobody else / gonna walk in your shoes / quite
the way you do /so be at peace with yourself / and keep a Spring in your heel /
keep climbing that Hill / and be at peace with yourself …” ( Be at peace with yourself
). A razão e a emoção lado a lado, porventura
por uma única e última vez.
“… Trees
don’t speak but they speak to each other …”