É oficial !!! O Atalho está obcecado com “Banga”.
Desde há uma semana, a mais recente produção de Patti Smith não para de rodar, em modo “repeat”. E não se prevê nenhum timing para retorno à normalidade.
Desde há uma semana, a mais recente produção de Patti Smith não para de rodar, em modo “repeat”. E não se prevê nenhum timing para retorno à normalidade.
Há duas formas de abordar “Banga”. Agarrá-lo pelos
cornos, ou seja pela música, ou começar por ler o delicioso booklet explicativo
que acompanha o CD e que a própria Patti (d)escreveu com um detalhe e minúcia
impares.
Comecei pela música, como aliás faço sempre. Fiquei agarrado.
Mas rapidamente percebi que estas canções fabulosas, épicas, contemporâneas, e
no entanto repletas de história e referências a culturas ancestrais,
necessitavam de ser compreendidas na sua plenitude. E só a autora o podia ajudar
a fazer .
Ao ler o booklet percebe-se que cada um destes opus ( e é
disso que se trata, pois este é o melhor Patti Smith desde há muitos anos ) tem
por trás, para além da vertente sensitiva, um trabalho de pesquisa que nalguns
casos tem anos.
E paradoxo dos paradoxos,
algumas destas canções ( “Seneca” por exemplo ) ganharam vida a bordo do “Costa
Concórdia” o transatlântico que recentemente naufragou na costa de Itália. “Fuji-San”
nasceu no rescaldo da tragédia do recente terramoto no Japão, “This is the girl”
( um tema que a própria Smith afirma que gostaria nunca ter escrito ) foi
inspirado no desaparecimento de Amy Whinehouse, “Maria” resulta
da reflexão de Patti quando confrontada
com o anúncio da morte da actriz Maria Schneider …
Mas nem todos os temas têm uma correlação com factos
históricos de conotação negativa. “Nine” nasceu em Porto Rico ao lado de Johnny Depp quando das
filmagens de “The Rum diary”. “Constantine’s dream” ganhou vida a partir da
obsessão peregrina de Patti e do
guitarrista Lenny Kaye, em busca do
local onde se encontraria uma pintura original de Piero della Francesca . Finalmente descoberta
por acaso nas paredes de uma igreja em Arezzo, no final de uma tournée em
Itália….
“Banga” são 12 canções de uma extraordinária riqueza. Feito de paixão,
dor, alegria, história, poesia muita poesia, trata-se de uma obra que para ser
devidamente compreendida e assimilada necessita de ser escutada no recato do
silêncio.
Só assim será possível perceber as nuances que a escrita de
Patti lhe confere. Só assim é possível interiorizar o lirismo que os instrumentistas lhe
emprestaram sempre que tal lhes foi pedido - Tom
Verlaine tem aqui duas intervenções à sua altura (“April Foll” e “Nine”) ,
Lenny Kaye para além de também compor, continua a ser a coluna vertebral de uma
banda que conta com os fiéis Jay Dee
Daugherty e Tony Shanahan. “Acessórios”
são ainda Johnny Depp (na guitarra acústica), os filhos Jesse e Jackson Smith,
este com um solo de guitarra antológico em “Maria”, a primeira responsável pelo
piano na versão de “After the Gold Rush”; um momento de rara magia, não apenas
pela escolha da canção – já em si significativa -, mas também pelo coro
infantil que a envolve e que transmite ao tema uma atmosfera de esperança e
optimismo que o original de Neil Young
talvez não tenha conseguido à época.
Haveria certamente outras formas mais pragmáticas de abordar “Banga”.
É até bastante provável que o tempo e a distância me levassem a escrever algo
diferente, embora, creio, nada de muito substancialmente diferente do que aqui
fica. Porém hoje, 11.6.2012, é assim que o sinto e é assim que vai ficar.
Um trabalho enorme.